23 de junho de 2009

"E, amor, provavelmente você não saiba dizer onde foi que eu larguei aquelas cartas passionais do verão retrasado. E nem saiba explicar como foi que pequei tão escancaradamente.

Havíamos perdido o juízo e a razão, e nos transformado no próprio álcool da garrafa. Ácidos e inoportunos. Rebeldes demais para nergarmos qualquer sentimento. Certeiros o suficiente para causarmos ressaca. Nos tornamos a velha insistência do caos. A malícia da intensidade. O desejo exacerbado, incontido e dilacerado. Tu era meu conto de amor barato e eu a desobediência penetrante em teus olhos.

E então, alguns dias se passaram. E eu só me dei conta, quando senti os minutos gelados escorrendo nos meus poros ansiosos. Sentada no chão, enfiada num texto passional, vômitando citações egocêntricas e perigosamente pessoais, te vi escapando pelas beiradas da minha boca. Te vi indo embora.

E apenas quem conhece a repetição de uma despedida idiota, sabe como é ter o peito e o pescoço nas mãos de alguém. Apenas quem desconhece o sabor da carne intacta, sabe como é amar ao contrário. Apertando o coração para calar o choro, enquanto se rasga e se queima velhas demonstrações futuras de amor.

E agora, com esse sorriso bordô e descabelada, proponho-me fugir para qualquer lugar onde eu possa espalhar-me em sorrisos grandes. Presa fácil. Mulher difícil. Quente como o asfalto da avenida e fria feito a chuva da semana anterior.

E talvez nem eu mesma saiba dizer onde foi que eu deixei aquelas antigas frases rasgadas. Mas não precisa se preocupar. Tu estará sempre vivo em tua momentânea morte imbecil, para ver o que é que se faz com as tais velhas cartas de amor, que nunca me escreveu."