10 de novembro de 2009

"Eu tenho medo de ouvir qualquer som; é como se a vida falasse pela tua boca e não se engane, não é de ti que tenho medo e sim da angústia que me fala aos ouvidos quando o mundo vibra dentro da minha cabeça, é quase uma afronta essa continuação indiferente das coisas. Sempre ouvi dizer que paz fosse uma coisa escassa. A paz, talvez, esteja justamente na ausência, nesse não-estar tão premente e solícito, avesso à insistência de toda presença que não seja a sua própria. Mas sim, eu falava dos sons e igualmente não falava, falava de coisa diversa, provavelmente da eternidade em que se transformou cada minuto, anoitece e amanhece e anoitece e amanhece e a história parece se esparramar inteira no assoalho gelado de um tempo que anda em círculos e eu ando, vê bem, eu ando tentando encontrar uma rota de fuga mas é tudo tão hermético, tão hermético, tudo, tu, eu, não escapo de mim, eu quero, eu avanço e retrocedo e colho razões ácidas e as quero doces na minha boca, como pode. É o som do tempo que não passa o que definitivamente me assusta. Hoje alguém telefonou e perguntou por ti; o que eu diria? Acabei não dizendo muita coisa, apenas um 'está bem' que poderia ser 'não sei', ou 'queira saber de mim que sou quem está aqui do outro lado da linha, mas queira saber apenas do que me fere e que não consigo dizer porque me espeta a garganta e não sai, e me afoga e me faz morrer de várias formas menos daquela que realmente me aliviaria, portanto tire isso de mim'. Já tentei todo tipo de promessa. E pare de dizer que eu faço drama, que eu sou egoista: isso é o teu orgulho te consumindo como a lança que transpassa o lado são de uma vaidade adoecida, não existo para ser teu oponente. Mas ando evitando ter juízo, é verdade."